terça-feira, 11 de abril de 2017

Especialista orienta para o rigor no uso do canabidiol como remédio

O uso do canabidiol, substância encontrada na planta da maconha, como remédio alimenta polêmica e boa dose de ignorância informativa em torno de seu conteúdo, sobretudo nas redes sociais. Para o psiquiatra Fabrício Gimenes, a prescrição da substância com função terapêutica deve seguir as aprovações estabelecidas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Hoje, o órgão aprova o canabidiol para tratamentos de epilepsia, dores crônicas e parksionismo (doença de Parkinson conhecida pela perda do controle motor e tremores, sobretudo das mãos). 
“Sou favorável ao uso da substância presente na planta da maconha, mas somente e quando o paciente não responder ao tratamento convencional. Não pular etapas no tratamento é fundamental. Tem um protocolo que deve ser seguido nesses tratamentos. Canabidiol não é regra. Ele é aprovado pela Anvisa para uso por pessoas físicas para três casos”, cita Gimenes.
Em janeiro, a Agência Sanitária brasileira aprovou também o registro do primeiro medicamento no País com o uso da substância em sua fórmula. A aprovação está indicada para o tratamento sintomático da espasticidade, moderada a grave, relacionada à esclerose múltipla. Mas o uso está destinado a pacientes adultos não responsivos a outros medicamentos antiespásticos.

Ou seja, a aprovação segue o critério sugerido pelo psiquiatra Gimenes de não pular etapas no uso. “Na epilepsia, por exemplo, se o paciente passa por um, dois, três, quatro, cinco e seis medicamentos anticonvulsivantes. Se não houve sucesso no tratamento com nenhum desses seis medicamentos, é que o canabidiol deve ser contado como possibilidade”, orienta.
O médico complementa: “Neste momento, como médico, acho que devemos seguir o protocolo. E se não tivermos uma resposta terapêutica, se o tratamento gerar consequências hepáticas e se, em linhas gerais, os riscos de intercorrência forem maiores, ou similares, do que o canabidiol, é uma utilização possível sim, quando chegar a hora de utilizar”, adverte.

Pedidos no país

Ele salienta que, em 2015, houve 1.449 pedidos de uso do canabidiol no Brasil. Destes, 1.279 foram aceitos pela Anvisa. “No site da agência, há uma série de normas para solicitação dessa droga. Mas não é droga de primeira escolha, nem o primeiro tratamento a ser prescrito”, reforça.
Na visão do psiquiatra, há tendência cultural do brasileiro em ir no mercado em busca de algo novo e concentrar todas as suas energias nessas novidades. “Mas, em matéria de tratamento com uso de medicamentos, o tempo é fundamental. Só o tempo é que vai demonstrar eficácia ou não. E essa regra na ciência é fundamental, para determinar consistência e resultados e para quais patologias”, defende.
E, nesse caso, a questão não é somente de tempo. “É questão de evolução e da gravidade. Essas variáveis são fundamentais para se lançar mão de um tratamento alternativo, que está posto hoje e não bem utilizado em nosso meio. Como tudo na medicina, é importante dosar o risco-benefício para se saber qual a melhor substância para lançar mão”, prossegue.

Primeiro medicamento é aprovado pela Anvisa

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou em janeiro o registro do “medicamento específico” Mevatyl (tetraidrocanabinol (THC), 27 mg/mL + canabidiol (CBD), 25 mg/mL) - canabinoides obtidos a partir da Cannabis sativa -, na forma farmacêutica solução oral (spray). É o primeiro medicamento registrado no País à base de Cannabis Sativa. 
O novo medicamento Mevatyl, registrado em outros países com o nome comercial Sativex, é indicado para o tratamento sintomático da espasticidade moderada a grave relacionada à esclerose múltipla.
Conforme a nota distribuída pela Anvisa, ele é destinado a pacientes adultos não responsivos a outros medicamentos antiespásticos e que demonstram melhoria clinicamente significativa dos sintomas relacionados à espasticidade durante um período inicial de tratamento com o Mevatyl. 
Outra informação relevante é que o produto não é indicado para o tratamento de epilepsia, “pois o THC, uma de suas substâncias ativas, possui potencial de causar agravamento de crises epiléticas”.

Risco e estigma

Como todo medicamento, há risco no uso do canabidiol, aponta Fabrício Gimenes. “Lembrando que, na Medicina, nada se cria, tudo se transforma. Então, toda substância exógena pode trazer consequências. A questão dos medicamentos alopáticos é que eles contam com evidência ao longo dos anos já consolidadas de seus efeitos. A medicina é uma ciência de verdade transitória. O tempo é quem vai mostrar se um medicamento apresentado agora vai funcionar”, pondera.
Assim, o canabidiol, para o médico, é mais uma substância que está sendo posta como capaz de ajudar nos sintomas de algumas doenças. “Cada medicamento tem uma linha de eficácia, uma estrada que leva a um caminho. E essa particularidade de cada medicamento também é levada em conta em um tratamento. Alguns carregam mais na função hepática, outros podem diminuir o processo cognitivo, outros não”, explica.
Na visão do psiquiatra, se a substância não tivesse sua origem ligada à maconha, sua possibilidade de utilização viria sem polêmica, durante o tempo. 
“O que traz muito estigma na discussão do canabidiol é o fato de ele ser originário da planta da maconha. Se ele viesse de outra fonte, talvez essa polêmica não persistiria. E é preciso dizer que os efeitos alucinógenos podem desencadear outros efeitos, provocando transtornos como psicose canábica, síndrome motivacional, entre vários outros”, acrescenta. 
A rigor, isolar um metabólico da planta e fazer o estudo clínico da pequena parte dela não tem relação com a maconha. “Mas o problema é o estigma da origem da planta. Canabidiol e maconha são coisas distintas. Mas o desconhecimento atrapalha na discussão”, avança.
Para quem tem a necessidade de utilização da substância definida junto ao médico, Gimenes orienta. “Hoje a aprovação do uso médico ficou mais fácil. O contato é por email, pela Internet. Basta seguir o protocolo que ninguém terá problema em importar o canabidiol, uma vez aprovado e com o controle pela Anvisa”, cita.

JCNET

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